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O efeito dominó da falta de renda na vida dos moradores do Chapadão

Por Ana Lúcia Vaz

“Parece aquele dominó, que uma peça cai e vai derrubando as outras”. É assim que Inessa Lopes descreve as dificuldades enfrentadas pelos moradores do complexo do Chapadão, na Pavuna. Inessa faz parte da coordenação do Movimento das Comunidades Populares (MCP). Além da Escola Jardim da Comunidade (EJC) e da creche comunitária, o MCP promove ações de geração de emprego e renda para adultos, que incluem um mercadinho coletivo e um banco comunitário.

Inessa Lopes - Foto: Facebook


Com a crise, a creche/escola comunitária lançou um pedido de ajuda à sociedade e aos apoiadores externos:

“Nossas educadoras têm o trabalho oferecido pela Creche/EJC como única ou importante fonte de renda. Algumas já começam a passar por dificuldades em casa. A mesma situação começa a se estender para alguns responsáveis de crianças que fazem parte da grande massa de trabalhadores autônomos em nosso país”.


Nas férias há sempre uma queda de arrecadação, uma vez que a escola não tem meios de exigir o pagamento de mensalidades durante as férias. “Com essa quarentena, a gente teve que parar”. Não por exigência do Estado. “Aqui é tão esquecido que não tem fiscalização. Os pequenos comércios estão funcionando”, explica Inessa. Situação semelhante a outras favelas. Mas a escola fechou pela consciência do risco da contaminação. Só isso já tende a reduzir a arrecadação. O pior, porém, é o efeito dominó. “A maioria dos pais e mães não está trabalhando e não está recebendo. Tem mães que são empregadas domésticas, tem mães que são vendedoras que ganham por comissão: se não vendem, não ganham. Quer dizer, a gente não pode exigir que os pais paguem, mas as professoras vivem do trabalho na creche”.


A escola atua há 23 anos na comunidade Chico Mendes, no complexo do Chapadão. A creche surgiu depois. Hoje, cerca de 50 crianças são atendidas e, além das atividades educativas, recebem alimentação e banho. As educadoras ainda levam as crianças pra escola, “porque as mães estão trabalhando”, explica Inessa. No começo era a pé, mas hoje a escola conta com uma van, que também oferece transporte a outras crianças. Este transporte externo é uma das fontes de renda que sustentam a escola e a creche. O projeto é sustentado com apoio externo, arrecadações próprias e mensalidade. As professoras são pessoas da comunidade.


Além de aprendizagem e convivência, o MCP tem um objetivo político-ideológico: o de organizar as crianças e as mães, promover a administração coletiva, “fazer com que as crianças cresçam vivenciando o espírito comunitário na prática”, explica Inessa.


No momento, estão sendo organizados plantões na escola para entregar os cadernos das crianças com o dever. “Foi a sugestão de uma mãe, baseado no que a prefeitura está fazendo”, mas adaptado à realidade local. A prefeitura está mandando trabalhos para serem impressos e realizados em casa. Mas, como todas as propostas de ensino à distância que estão sendo promovidas, a solução não é igual para todo mundo. No Chapadão, segundo Inessa, quase ninguém tem impressora em casa e, em geral, não tem dinheiro para pagar a impressão. “Por isso, nós resolvemos passar os deveres nos cadernos e marcar um dia para as mães virem pegar”.


O próximo passo é tentar fazer um levantamento, dentro do possível, das famílias em condições mais difíceis para organizar doações. Fora isso, claro, “estamos todos esperando que saia o auxílio emergencial do governo”.

Trabalho social e mobilização coletiva


O Movimento das Comunidades Populares (MCP) completou 50 anos no ano passado. Sua origem está na Juventude Agrária Católica, que se organizava tendo a Igreja Católica como base de apoio. Ao longo dos anos 80, quando o Brasil vivia um processo de democratização, o movimento foi se desligando da estrutura da Igreja para ter mais autonomia. Segundo Inessa, foi nesse período que ganhou o nome de MCP e deixou de discutir religião para se voltar exclusivamente para a mobilização. Em 2001, “deixa um pouco o perfil reivindicatório e começa a dar mais prioridade para os grupos de trabalho coletivo”. Com isso, “retoma a discussão religiosa, mas desligado da Igreja”.


Hoje, a participação no MCP independe de religião, mas, como explica Inessa, a religião é um aspecto importante do trabalho popular, “porque o povo brasileiro é muito religioso, a gente acha que é impossível você fazer um trabalho social sem lidar com arte, com mística e com religião”. E conclui:

“A gente quer uma religião que ajude nesse trabalho de libertação do povo. Nada disso é fácil na prática. Mas a gente acredita que tem que construir alternativa. E começa pelo embrião. É anunciar a boa nova.”

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