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Volta das escolas: mães da Maré são contra



Por Carolina Vaz e Diana Osório para O Cidadão


Milhões de mães, pais, avós e outros tutores no Rio de Janeiro querem saber: as escolas voltam à atividade ou não? É seguro para as crianças e adolescentes? A cidade já registrou, em números oficiais, cerca de 82 mil infectados e quase nove mil óbitos. Todo dia, aproximadamente 500 pessoas são infectadas. O prefeito Crivella tenta de todo modo fazer voltarem as escolas municipais, mas está impedido por uma liminar da justiça, e o governo do estado vê a possibilidade de reabrir as estaduais a partir de 5 de outubro. A questão é fundamental para a Maré, com suas 17 favelas e 140 mil moradores, muitos deles crianças e adolescentes.


Apesar de todas as questões envolvendo a volta ao trabalho dos adultos, o ano letivo praticamente perdido com o ensino remoto inacessível e ineficiente, todo o tédio, impaciência e ansiedade dos alunos, o que se percebe é que, por agora, a população não julga ser seguro voltar às aulas presenciais.


Essa é a posição, por exemplo, da estudante Raíssa Araújo da Silva, de 16 anos. Ela mora na Vila do Pinheiro e estuda no Instituto Superior de Educação do Rio de Janeiro (ISERJ), de segunda a sábado. Quando as aulas presenciais pararam, algumas atividades continuaram online, mas nem todos os professores fizeram conteúdo próprio e nem cobraram entrega de trabalho. Tudo que foi passado ela fez pelo celular. No caso da escola de Raíssa, o plano para a volta às aulas é fazer um esquema de rodízio de alunos, de modo que cada um só iria em alguns dias da semana. Mas essa solução ignora outras questões, para a estudante: “As pessoas ainda enfrentariam superlotações nos trens e metrôs, então não adiantaria ter um rodízio na escola. Antes de chegar na escola elas teriam que passar por aglomerações”. Ela conversa com os colegas e afirma que, para a maioria, as aulas não devem voltar. “Ainda não temos vacina, não temos certeza de quem contraiu a doença e quem não, se as pessoas realmente criam anticorpos… então é tudo muito incerto”.


Raíssa Araújo: “não adianta ter um rodízio de estudantes”. Foto: arquivo pessoal.

Outro ponto levantado por Raíssa tem a ver com as questões psicológicas desenvolvidas por muitos alunos, principalmente ansiedade, e que podem ser intensificadas se eles tiverem que se arriscar. Essa é uma preocupação, também, de Angela Santos, professora de matemática da rede estadual, que ensina no Colégio Bahia. Segundo ela, uma série de problemas acometeu os estudantes de uma maneira que a escola não tem condições de lidar, muito menos remotamente. Desemprego, dificuldade de subsistência das famílias, sobrecarga de trabalho, depressão, ansiedade e muitos outros. As professoras e professores, que tiveram que transformar o computador (ou celular) no quadro e no livro, transformar a sua casa em sala de aula e lidar também com as questões de seus alunos e respectivos responsáveis, não ficam de fora do problema. “Infelizmente, a escola não possui uma equipe psicossocial que possa dar suporte e acompanhar esses alunos ao longo desse processo de pandemia”, afirmou.


Apesar de a maioria dos problemas serem consequência da quarentena e da crise econômica que acometeu as famílias, não é voltando ao “normal” que tudo vai se resolver. Onde Angela leciona, as salas já são lotadas, os banheiros e refeitórios são pequenos, não há boa circulação do ar. Para ela, não é possível manter isolamento social desse jeito, assim como não é possível proteger todos os frequentadores da escola e seus membros mais próximos. “Não há como retomarmos as aulas sem colocarmos em risco as vidas da comunidade escolar e das nossas famílias. Como vou dar aula, estar em contato com várias pessoas e voltar para casa tranquila sem pensar na possibilidade de infectar minha avó de 80 anos que está morando comigo?”

Angela Santos: volta das escolas arrisca as vidas das famílias. Foto: arquivo pessoal.

Crianças e adolescentes: desafios para manter a segurança


Para quem tem crianças em casa, a quarentena não tem sido nada fácil. Na casa da costureira Juliana Lima, moradora da Baixa do Sapateiro, são sete pessoas: ela, o marido, a filha mais velha (22 anos), três outros filhos (6, 8 e 10 anos) e o neto (5 anos). Antes da quarentena, a rotina “era uma correria” para levar e buscar das escolas e creches. Mas, com a quarentena, ficou chato, apertado, monótono. “Imagina quatro crianças trancadas dentro de casa. Quando você tem uma casa com quintal, como as pessoas que têm um poder aquisitivo melhor e têm sítio, vão para o sítio se isolar, as crianças têm espaço… aqui em casa não tem espaço para eles, só na laje. Aí você imagina a energia deles sem poder gastar, trancado dentro de casa”. Hoje, eles passam o dia em seis pessoas, pois a filha mais velha trabalha fora. Ainda é incômodo, mas, para Juliana, é melhor do que colocar as crianças em risco. Sua filha menor, inclusive, tem bronquite, sendo do grupo de risco. Se as aulas voltarem agora, ela não volta.


Juliana Lima e família: maior preocupação é com os menores. Foto: arquivo pessoal.

A maior preocupação de Juliana para mandar as crianças de volta à creche e escola é com os menores: a filha e o neto de 6 e 5 anos. “Como as crianças menores vão ficar de máscara dentro da creche? Eles não vão ficar, não têm esse entendimento do que está acontecendo no mundo lá fora”, afirmou. Essa é a preocupação também de Renata Estevão, que mora com os filhos de 3 e 14 anos na Nova Holanda. Na quarentena, ela ficou sozinha com as crianças. Desempregada, conseguiu se manter pelo Bolsa Família, pagamento de pensão dos pais e pelas cestas básicas que recebeu, embora nenhuma tenha sido mandada pela prefeitura. A filha, que está no nono ano, não teve aulas com professores online, apenas recebeu apostilas que foram distribuídas na Associação de Moradores e acessa atividades pelo celular. Ela também se preocupa com o retorno da escola. “A mais velha já entende e tem medo. Ela pergunta ‘mãe, vai voltar (as aulas)? O coronavírus foi embora? Já acabou a pandemia? Vai voltar tudo ao normal?’ E como ela tem acesso à internet ela sabe que o vírus não foi embora, que a gente ainda está na pandemia, que a quarentena ainda existe. Embora tenha havido flexibilização, o vírus está circulando”. Mesmo vendo a filha preocupada, Renata não confia que todos os cuidados seriam tomados. “Meu filho tem 3 anos, você imagina ele numa creche com um monte de criança, aí tem álcool em gel e máscara, mas daqui a pouco ele puxa a máscara, usa a do coleguinha… A minha filha é uma adolescente, tem 14 anos, mas você acha que realmente vão seguir à risca o distanciamento, o álcool em gel na mão, a máscara o tempo inteiro? E vai existir aglomeração, não adianta… Enquanto não existir uma vacina, eu sou contra”.


Assim como Juliana Lima, a diarista Maria Betânia de Souza, do Parque Maré, tem quatro crianças em casa, de 15, 12, 6 e um ano de idade. Na casa dela, com seis pessoas, na quarentena também ficou “todo mundo em casa sem ter o que fazer”. Para Betânia, um dos maiores desafios foi ajudar os filhos a estudar. Ter que ser mãe e professora ao mesmo tempo dobrou sua carga de trabalho. Ela, que não concluiu os estudos, tem ajuda da filha mais velha, embora esta já tenha suas atividades para realizar. A de 6 anos já perdeu a vontade de fazer o que a escola manda. A filha de 15 está no nono ano, prestes a entrar no Ensino Médio, sente que tem dificuldades e quer que as aulas voltem. Mas a mãe, apesar de todas as dificuldades, é completamente contra.



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